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Flores de Goiás
Breve História


Fonte: Por Raphael Lorenzeto de Abreu - ImageGoias MesoMicroMunicip.svg,
own work, CC BY 2.5, httpscommons.wikimedia.orgwindex.phpcurid=1154582


Por Bruno Santiago

Localizada às margens do grande Paranã, lado direito ou a nascente do rio, está a cidade de Flores de Goiás. É a mais importante da mesorregião goiana do Vão do Paranã, uma extensa área de planície do extremo leste do Estado, convergindo com a Bahia. Essa região a propósito, drena todos os cursos d’água que brotam na longa Serra Geral de Goiás, fronteira com a Bahia, cursos estes que formarão os rios e ribeirões que se dirigirão ao Paranã, em sua margem oriental. O Vão limita-se a Oeste com a imponente Serra Geral do Paranã, mais conhecida nacionalmente como Chapada dos Veadeiros, pois o cume da Serra é propriamente o altiplano onde milhares de visitantes marcam o lugar. De acordo com as informações do IHGG (01) o Vão do Paranã comunica-se fisicamente com a região norte do Brasil, ou seja, com a atmosfera amazônica, daí os ventos quentes que sopram na região. Outra informação interessante nos trás Paulo Bertran (02): em toda a extensão encontram-se zonas pantanosas, verdadeiros alagadiços de imensa riqueza aquífera, formando em muitos casos lagoas e olhos d’água numa sequência constante. Destoando do relevo planaltino de Goiás, o Vão (Vale) do Paranã é uma única planície, flanqueada por duas Serras que o confinam na vastidão dos horizontes. Para não ser geograficamente insincero, apenas um serrote o pontilha, nas imediações setentrionais da cidade de Flores. É caso único em Goiás e particularmente no Planalto Central, cravejado de serras, chapadas, chapadões e campos limpos, com pequenas planícies a forrar-lhe os vales.

Mas com relação à cidade de Flores, esta surgiu na segunda metade do século XVIII, por iniciativa do súdito português desbravador Domingos Álvares Maciel, mais precisamente no longínquo ano de 1740, segundo registros do citado IHGG. Natural da Bahia, Maciel povoara o sítio em que se encontra a cidade com intuito de criar gado, pois as pastagens ali são riquíssimas. Era donatário de sesmaria doada pelo então capitão general (governador) de São Paulo Conde de Sarzedas, o que portanto lhe conferia o patronato real para povoar aquelas plagas. Não se sabe muito sobre este desbravador/povoador baiano, mas sabe-se que gozava da confiança do governo e tinha relações com as autoridades em São Paulo, daí lhe conferirem a posse de terras. Naquela altura todo território goiano pertencia à Capitania de São Paulo, vindo a emancipar-se por decisão régia em 1749. Provindo da Bahia, Maciel e sucessores (descendentes?) continuaram no sítio de Flores, denominado logo depois como Arraial de Nossa Senhora do Rosário de Flores, com igreja dedicada à Senhora e uma outra também dedicada à Senhora do Rosário dos Homens Pretos.

Ao contrário das demais localidades goianas, Flores não nasceu da saga aurífera, pois não havia leitos com suficiente metal em aluvião que lhe suscitasse levas de garimpeiros. Ao que tudo indica o gado e seus derivados, foi a economia do lugar e aqui vale uma explicação breve. É que o então arraial assentava-se num propício solo para a pastagem, rico em água, sal e capim melado, isso primeiramente; segundo que o assentamento de Flores está a poucos passos da importante via terrestre para a Bahia, a picada da Bahia como a conheciam, uma ramificação da Estrada Real Rio – São Salvador. Mais tarde convertida pela Coroa em Estrada Real também, a referida picada tangenciava Flores para quem provinha das ricas zonas diamantíferas da Serra das Almas, mais conhecida como Chapada Diamantina. Após o Arraial de São Domingos precisamente na fronteira, a próxima paragem seria o Arraial de Flores, que possuía o suficiente para abastecer as corajosas caravanas de tropeiros que singravam os sertões da América Portuguesa.


Mapa de Goyáz, organizado em 1874, por ordem do governo. Flores aparece a direita do mapa, próxmo ao Forte. Ambos são classificados como Vilas, uma categoria inferior a cidade.


Ainda no último quartel do século XVIII não é possível saber se Flores já se constituía como pequeno arraial agrícola. Igualmente pouco se sabe a respeito de seu fundador, o citado Domingos Álvares Maciel, mas é provável já ter desaparecido por volta de 1775. A certeza documentada em evidência histórica é que em 1758 havia a concessão eclesiástica (da Capitania de Pernambuco) para a instalação no lugar de uma igreja (capela?) dedicada à Nossa Senhora do Rosário (tendo flores como atavio sacro), como revela o prestigioso sino até hoje pendurado na lateral poente da igreja centenária. Ostenta as armas da Coroa portuguesa e da Casa de Bragança por certo que cunhado ou em Minas ou mesmo no Rio de Janeiro, ou inclusive na capital real, Lisboa. É mais uma investigação por suposto. Porém ao se instalar um templo com autorização eclesiástica pressupõem-se a chancele governamental, nesse caso da Capitania de Goiás ou mesmo do Vice Reino no Rio. O mais provável é que ambos os poderes concorreram na elevação de Flores a arraial já em 1758, pois se existe o templo instalado, este era permitido apenas para os arraiais confirmados formalmente – legalmente por aqueles poderes mencionados. Observe-se que em fins da década de 1750 e por toda a década seguinte, a riqueza aurífera nas Minas Gerais já davam nítidos sinais de esgotamento, sendo as minas dos goyases a esperança de muitos. Não seria de todo errôneo se povoamentos fossem feitos nas picadas que da velha Bahia de Todos os Santos, de São Paulo ou das Minas Gerais convergiam para Goiás, a terra prometida ou o eldorado, segundo informa Bertran(03).

É assim que três importantes registros fiscais régios foram instalados no curso dos caminhos que da Bahia (e de outros territórios do Império como Pernambuco e Maranhão) adentravam em Goiás, a saber: o registro de Santa Maria, o mais oriental, localizado em uma das poucas passagens da Serra Geral na divisa de Minas – e que hoje desemboca na BR 020 na altura do posto e do povoado de Santa Maria – o registro da Lagoa Feia nas proximidades de Formosa, a dizer do Coronel Olympio Jacinto na margem setentrional da lagoa, e que se justapunha em excepcional miradouro de toda a região que hoje constitui o norte do Distrito Federal, e por fim o registro de Arrependidos perto da estrada Brasília-Unaí na região moderna do PAD-DF (leia-se padefe). O expediente desses registros régios explica a constituição de povoamentos ao longo dos caminhos que penetravam o sertão goiano. Víveres, acomodação de gente e animais com segurança – pouso para as tropas – pequenas trocas na modesta relação econômica que se estabelecia e sítio para fixação dos organismos do poder monárquico na colônia, tais como milícias, contagens, juízos e outros. O Arraial de Flores correspondia a essas necessidades administrativas e econômicas do Estado e das gentes, porque era geograficamente centralizado entre os caminhos reais citados. Conveniente pois correspondia àquelas demandas que tropeiros e contingentes da intendência precisavam quando perambulavam pelos densos sertões do cerrado planaltino.

Como principal arraial do vasto Vão do Paranã, às margens do grande rio, Flores exercia uma modesta, mas invulgar força centrípeta sobre os caminhantes e as caravanas que buscavam os rumos: oeste, com destino à sede da Capitania de Goiás, Vila Boa (Cidade de Goiás hoje) e a Meia Ponte (atual Pirenópolis); norte, com destino aos arraiais auríferos de Cavalcante, São Sebastião do Forte, Arraias e Natividade; para o sul com destino a Couros (hoje Formosa), Arraial de Mestre d’Armas (Planaltina) e a pujante Santa Luzia (moderna Luziânia) e demais localidades. Bem sabido que as paragens do vale do Paranã atraiam certo número de aventureiros e homens destemidos que vendo o potencial agrícola e criatório de terras tão férteis e abundantes em água, terminaram por se fixarem, sedentarizando-se e promovendo aquilo que a Coroa tanto almejava para o território: o povoamento. A sazonalidade ou a transumância que a mineração provocava no mundo planaltino que se forjava então, não era compatível com a criação, nem com as culturas em geral. E a produção de bens derivados da criação e das lavouras marcaram a vida social e econômica de Flores, já em fins do século XVIII. Vital, sublinhe-se mais uma vez, para o abastecimento das tropas e contingentes governamentais que provenientes do norte adentravam em Goiás pelo leste, encontrando no Arraial de Flores cobertura necessária para si.

Algumas décadas depois, durante o Primeiro Reinado, em 1823/1824, o general Cunha Matos, comandante do Exercito imperial brasileiro, em pormenorizado estudo descritivo (corográfico) sobre os interiores do nascente país, dizia de Flores;
“Os seus moradores são ricos em gado, em que consiste a sua principal fortuna. Está situado na margem direita do rio Paranã na latitude de 13 graus e 42 minutos meridionais (...) em terreno muito plano, e próximo a cinco grandes lagoas. Possui duas companhias de cavalaria e uma de infantaria de pardos, e outra de pretos milicianos, e uma de ordenanças.” (04)

As duas igrejas de Nossa Senhora do Rosário – dos brancos e dos pretos – reuniam as celebrações e festividades do arraial, com marcado acento luso-africano, mas com identidade própria. Não havia qualquer irmandade ou instituição de foro eclesiástico, que encenasse as ricas celebrações ao estilo de Vila Boa ou Meia Ponte. Mas nem por isso, os moradores deixavam de cultuar e prosseguir com as ancestrais tradições que herdavam de suas origens, seja portuguesa ou ibérica, africana ou ameríndia.  

01- Instituto Histórico e Geográfico de Goiás. Disponível em: http//www.ihgg.gov.go/mapasgeologicos Acesso em: 25/07/2017.
02-Bertran, Paulo. História da Terra e do Homem no Planalto Central.
03-Bertran, Paulo. Op. Cit. P. 23-24.
04Cunha Matos, Raymundo José. Corografia Histórica da Província de Goiás. P. 123.

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